A eleição do Snapchat? Não nos EUA, mas pode ser no Brasil
No início deste ano, Barack Obama chamou os marqueteiros para avisar: se a eleição de 2004 foi com o Meetup e a de 2008 foi baseada no Facebook, a de 2016 terá o Meerkat e o Periscope como principais veículos. Acrescento aí o Snapchat, com o seu crescimento avassalador entre os mais jovens e seu esforço considerável em valorizar o conteúdo original.
A análise do político que revelou a aposta de Obama, porém, mostra que nunca foi investido tanto dinheiro na televisão no período pré-eleitoral norte-americano.
Para o caso norte-americano, isso faz muito sentido. Há uma dúzia de pré-candidatos republicanos, enquanto Hillary Clinton parece bem consolidada entre os democratas — apesar do atraente idealismo de Bernie Sanders.
Além disso, a presença de políticos com plataformas consolidadas e presença forte na grande mídia (como Donald Trump, Jeb Bush, Marco Rubio, Scott Walker e a própria Hillary) aumenta as apostas em meios já conhecidos, com zonas de conforto bem estabelecidas.
Além disso, os valores altos de investimento acompanham o crescimento econômico norte-americano como um todo — há mais dinheiro para apostar, e o medo de ver que o candidato concorrente está apostando alto foi potencializado com a presença do multibilionário Trump.
Os investimentos em TV aumentam, assim como devem aumentar os investimentos em anúncios no Facebook, em equipes de transmissão no Periscope e em editores de vídeos no Snapchat.
Ainda estamos em 2015, é cedo para decretar que a eleição americana optou pelo tradicional. Ainda existe, na visão dos marqueteiros, a ideia de que a internet é um meio dinâmico demais para investir pesado por um longo tempo — o trabalho deve ser reforçado mais perto do pleito, quando os comitês republicanos e democratas se unirem em torno de um candidato apenas.
Porém, as previsões de Obama para a eleição americana podem funcionar muito bem para as eleições municipais do Brasil em 2016.
Esqueça o broadcast – Redes sociais são para nichos
O Facebook está apostando com força em conteúdo personalizado, com base em interesses e no local, há bastante tempo. Em um contexto eleitoral, isso faz uma grande diferença — é bem possível que a grande maioria dos eleitores brasileiros receba nos seus feeds apenas que interessam aos seus candidatos municipais, renegando completamente a oposição, por maior que ela seja.
Não é a mesma situação de 2014: existem várias diferenças, e o acirramento dos ânimos no pós-eleição aumentam essas diferenças.
No pós-eleição, muitas pessoas deixaram de seguir amigos e parentes próximos por questões políticas (também porque o Facebook tornou essa ferramenta mais fácil e intuitiva a partir de março de 2015) e isso mostra para o algoritmo qual é a sua posição política e o que você quer ver no News feed.
Além disso, os direcionamentos por interesses que estão disponíveis para páginas permitem a uma página entregar apenas o conteúdo que interessa para os seus usuários — ou seja, posts sobre Dilma apenas para quem gosta de Dilma, ou sobre Aécio apenas para quem gosta de Aécio, ou fazer o contrário para gerar mais engajamentos.
Nada disso é novidade para quem trabalha com mídias sociais, mas aumenta a percepção de que, definitivamente, o Facebook não é mais uma ferramenta de broadcast — ele serve para entregar o melhor conteúdo possível para pessoas que flutuam em determinados nichos, mas nunca para todas as pessoas que estão na rede.
Twitter e Instagram, que tem feeds totalmente limpos — entregam os posts em tempo real, independente dos seus interesses — também estão apostando em capturar usuários através dos nichos.
Os “destaques de notícias” que o Twitter estreou este ano, assim como o “enquanto você esteve ausente”, têm como objetivo entregar posts que são relevantes para você, acima do vetor tempo. O Instagram passou a veicular anúncios, também com base nos perfis que as pessoas curtem e na sua localização.
O objetivo de todas as empresas é manter você o máximo de tempo possível nas redes — para isso, ninguém se indispõe em manter você na zona de conforto ou na bolha.
Como as eleições de 2016 são municipais, a bolha estará mais forte que nunca. Quem perceber que está nela e definir estratégias de como sair — ou como entrar em outras bolhas que sejam simpáticas à sua — vai levar vantagem.
A guerrilha contra a crise
No Brasil, os programas políticos na TV são gratuitos. Não existe a possibilidade de compra de espaço maior como existe nos EUA. Entretanto, esses programas ainda têm um custo de produção muito alto, o que faz uma enorme diferença em uma fase de crise econômica e provável retração nas doações de campanha.
As redes sociais acabam virando ferramentas “baratas” de disseminação de uma ideia política em torno de um candidato, desde que essa ideia exista e seja clara para toda a campanha. Muitos candidatos, faltando um ano para a eleição, sequer têm uma diretriz para adotar no pleito. Quando você não sabe o que quer, fica bem mais difícil focar no seu interesse.
É em cenários como esse que floresce o marketing político de guerrilha.
Ferramentas como Snapchat e Periscope são ótimas para o marketing político de guerrilha. Elas entregam exatamente o que o usuário quer ver abdicando de links externos, com uma ferramenta totalmente limpa. As soluções podem estar ao alcance, sem gastar muito— basta ter boas ideias e um discurso sólido.
Se a previsão de Obama não é suficiente para os EUA, ela pode ser para o Brasil. Quem se mexer mais rápido terá vantagem.
Mais sobre o tema
Issie Lapowsky, na Wired, considera que a falta de anúncios no Snapchat prejudica a disseminação da rede social como plataforma eleitoral nos EUA — no Brasil, esse é um problema menor, graças à legislação.
Steve Hilton, na Bloomberg, fala sobre o possível impacto orgânico do Snapchat na eleição americana. Vale assistir ao vídeo inteiro.
O próprio Snapchat está interessado em contratar pessoas que entendam de política e notícias locais. Segundo a Time, esse é o segredo para conquistar de vez o marketing político.
Por Luiz Felipe dos Santos no site A La Fresca